domingo, 31 de julho de 2011

Em paralelo

As paralelas juntavam-se no final. O número, ímpar. Três. Olhavam em frente sem definir um foco. Por baixo deles, brilho. Um brilho dissimulado que se reflectia nos seus pés. Os deuses são assim. Gostam que todo o brilhos dos homens nunca ultrapasse os seus pés. Perfeitos, paralelos, incrivelmente paralelos, tocando-se no fim. Talvez quando se tocam deixem de ser deuses. E consigam espreitar pela pequenas escotilhas da alma as verdadeiras realidades. Nunca consegui perceber se são os homens que querem ser deuses, ou se serão os deuses que quererão, em alguns momentos, ser apenas homens. Quem quererá viver para sempre? Não sei. E o contrário também não. Talvez apenas ache que todos temos um tempo para provar que merecemos passar por cá. A caminho de onde, também não sei, nem sei se isso me interessa muito. No fundo, não sou nenhum deus. E mesmo que fosse odiava saber tudo. Os deuses sabem sempre tudo. É que saber tudo é o tal meio-caminho andado para não se saber mais nada. E homem que é homem quer saber sempre mais um bocadinho. Afinal, o saber, ou lá como lhe chamam os homens, não ocupa nenhum lugar. Já para os deuses o conhecimento simplesmente existe neles. É natural saber-se tudo. Se calhar, o melhor é que deuses e homens continuem a ser paralelos, mas que nunca se juntem no final. Não haveria paciência para deuses-homens e, muito menos, para homens com a mania que são deuses. Paralelos ou não, tenho conhecido alguns destes. Homens e mulheres que são deuses. Quer dizer, olhavam-se no espelho e reflectiam-se como tal. Os seus olhos apenas viam as suas vaidades e poder aparente, julgando-se no direito fazer dos homens seus brinquedos. E assim foi durante algum tempo. Homens nas mãos dos deuses. Deuses a brincarem com os homens. Até que um dia, a vida ou ou destino como os homens lhe chamava quando não sabiam o que dizer, se encarregou de corrigir a brincadeira dos homens-deuses. Foi quando começaram gritar ‘Ai meus deuses’, enquanto tentavam libertar-se dos fios de marioneta com que os deuses, os verdadeiros, os manipulavam como brinquedos. Talvez nunca venham a perceber o que realmente lhes aconteceu. Talvez isso, na verdade, nem lhes interesse. Quanto aos homens, os reais, esses puderam seguir o seu caminho, juntando-se no final, como as paralelas. E finalmente puderam ser eles a olhar pelas escotilhas das suas almas e ver o que se passava no andar de cima. Ou de baixo.

1 comentário:

Patrícia Trévidic disse...

http://www.youtube.com/watch?v=a-GemVG_6Ec


http://www.youtube.com/watch?v=mYwuXvA589A