sexta-feira, 28 de agosto de 2009

Dia 19 de Agosto – O dia depois de amanhã há mais de uma semana

Tinha chegado o dia que eu achava que era depois de amanhã, pelo menos depois de ter visto Nova Iorque com gelo a apagar a chama da Liberdade. Lá fui. Ora se já era depois de amanhã, já tinha passado. Mas não passou. Num dia depois de amanhã tudo acontece muito lentamente. Cada segundo é vivido como se fosse um minuto. E cada minuto como se fosse uma hora. E por aí fora. Mas nesse dia, acordei muito mais depressa que o costume. E, ao contrário dos outros dias, não comi. Limitei-me a entrar num jejum consciente que me deu cabo do meu equilíbrio psíquico. Depois, lancei-me para o carro armado de malas e bagagens. Iniciei a viagem. Num dia depois de manhã, não se goza cada momento da viagem. Antes se vive intensamente a ansiedade do que ainda não chegou. E imagine-se, se é depois de amanhã já hoje e se ainda se antecipa, é como viver sem gozo, a vida antes de acontecer. Quando se olha pela janela e se vê a paisagem de um dia depois de amanhã, o pássaro que não tem coragem para nos olhar nos olhos ainda lá não está. E nem sei se estará. As palavras que trocamos ainda não se formaram e, como tal, talvez nem signifiquem nada. E como nada significam são vazias e desprovidas de qualquer sentido. Num dia depois de amanhã cria-se uma barreira entre o que é e o que pode vir a ser. A antecipação não significa que as coisas acontecem realmente. Num momento desse dia pedi um passe de mágica que me levasse para outro dia. Pedi mas ninguém me ouviu. Quer dizer, acho que me ouviram, só que ninguém levou a sério o meu pedido. Mas também, é difícil levar a sério um pedido destes: ‘olhe, leve-me para outro dia, quando tiver a tirar o coelho da cartola!’. Não bate certo. Num dia depois de amanhã o que é que realmente bate certo? Tudo e nada. Para meu bem, no meu dia depois de amanhã, que por acaso foi há mais de uma semana, espero que tudo.

1 comentário:

André Oliveira disse...

Nem mais, meu caro. Incisivo como sempre. O que eu mais queria era que os meus dias depois de amanhã me fizessem tão feliz como me angustiam. Seria mais justo.